sábado, 8 de agosto de 2015

QUANDO ME DISPONHO A ESCREVER - RETORNO DE CHAPECÓ.

Aqui estou com mais um texto longo demais para Fnac, mas se você tiver tempo e teimar em seguir em frente, vamos lá. Faço o desenho do dia. Volto minha atenção para o paletó sobre a cadeira, traço algumas linhas que conduzem meus pensamentos para os vários momentos que passei na cidade de Chapecó para lançamento dos livros "A Invenção da paisagem" e "Pintura sobre pintura". Queria falar desses instantes neste desenho, mas pode um desenho falar de tantos momentos?
Escolho um momento, ou melhor sou escolhido por ele, sim, porque veio assim avisar, sem eu menos saber, um simples paletó sobre a cadeira; uma imagem certamente sem muito significado, ou melhor sem importância nenhuma. Mas me disponho a desenha -lo como sendo o meu desenho do dia e, agora, quando me disponho a escrever sobre este momento, enquanto as horas de voo se desdobram, ele se me apresenta com toda sua singeleza e falta de lugar.
Que desenho é este? Algumas linhas frágeis, uma forma convencional - nenhuma originalidade, nenhuma revolução! Na verdade este é um momento despretensioso, um momento em que me permito desenhar meu paletó, meu canto de parede, um momento de silêncio alguns minutos do dia que nasce, um instante da minha estadia em Chapeco. Deixo as formas do assento e das pernas da cadeira inacabadas, no entanto, sinto o desenho acabado. O olhar ativa às formas, completa o desenho.
Gostaria de desenhar algo mais importante ou intrigante visto ou descoberto aqui, a terrível história do incêndio da igreja, os momentos passados no sítio da Ingrid, colhendo ameixa e laranja no pé, andando descalço na grama sob a sombra de araucárias centenárias, mas calhou de ser este desenho do dia. Ele é um resumo deste dia? Não, Ele é um resquício desse e de outros dias que me trouxeram até aqui, ele é um grão de poeira neste universo.
Desenho como se
converssasse com meu paletó, ou melhor com as dobras que fazem vincos e curvas e com as linhas que caminham na folha branca. Gostaria de levar essas linhas para passearem. Escuto os pássaros lá fora. A sonoridade deles dançam no ar, fazem curvas, chegam até perto da janela, depois distanciam; depois, veem outros pássaros, depois, os carros que fazem fundo a estes traços, por fim, o silêncio espaçoso que orquestram todas essas formas. Deixo o assento e as pernas da cadeira inacabadas como uma conversa que se perde no silêncio, ou melhor na distância, a qual gente não a escuta mais com nossos ouvidos, mas que continua a existir (em nosso coração).
Tomamos cafe da manhã na chácara. Cada um coloca uma palavra de agradecimento neste encontro. Alimentar juntos é um ato de socialização e também estético.
Ao decolar sinto a trepidaçao forte do pequeno avião e tenho sensação do que é voar sem ter asas. De la de cima vejo o rio serpenteando os campos verdes. Será o Rio Uruguai? De repente uma barragem, será a de goi-em? (como se escreve?). Verdes claros, escuros, pardos, amarelados estendem-se sobre a terra como um lençol que se dobra e desdobra sob nossos pés, sob as nossos vistas. Uma linda paisagem vai e desenhando e redesenhado em meu caminho, ela está lá fora, mas certamente eu a invento em meu coração. Volto para Casa agraciado revitalizado pelo encontro. 

Aos teimosos que me leram até deixo meu abraço, com carinho.



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