domingo, 8 de março de 2015

Depois de um mês de inverno



Depois de mais de um mês de inverno e de neve, passeio de bicicleta com o filhote. Levo um caderno de desenho e o celular para registrar algum traço do nosso passeio. A paisagem da Praia, velha conhecida é nova, como novo é o vento. Então o filhote pede para passarmos na floresta à Beira do canal. Na verdade um mangue meio abandonado que descobrimos ano passado e, inventamos de caminhar nas suas trilhas enlameadas dizendo que era uma floresta. De cima do barranco o intrincado das raízes parecem esculturas de Frans Krajecber. Em um minuto passo em revista a obra desse grande artista que viveu em uma caverna em Minas fugindo dos horrores da guerra nazista. O que é viver sozinho no ermo do mato? Ele não teve medo? Neste momento percebo umas caixas de papelão instaladas entre as raízes e panos pendurados nas árvores.

Alguém está morando por ali, penso. Entro ou não entro nesta floresta? O filhote insiste em descer, afinal aquela floresta era nosso caminho de aventura há dois meses! Vou mais para frente e descemos em uma área que julgava desabitada e segura. Começamos a caminhada e a tensão se instala. Olhando para todos os lados damos alguns passos. Então descubro uma bolsa jogada no chão, rasgada e com objetos espalhados ao redor: moedas, batom, pincel de maquiagem, uma caneta e uma carteira de identificação. Trata se De uma certeira de identidade da Slovenská Republika. Na foto uma bonita moça, com data de nascimento, Julho de 1990. Uma garota de 25 anos, como viera parar ali? Que teria acontecido?  Será que ainda estaria precisando desse documento? Que poderia eu fazer para lhe devolvê-lo?

Como desenhar neste cenário? Acho que foi Adorno, filósofo da escola de Frankfurt, que disse que depois de Auschwitz não seria mais possível a arte. Guardo o caderno. De repente aquele cenário bruto e bucólico se revela ameaçador. Em Minha cabeça precipitam imagens violentas. Tanta coisa pode estar por trás de uma bolsa rasgada jogada na rua! Penso no mal que corrói o humano e na necessidade de todos os dias construirmos o bem. Lembro me das palavras de Hannah Arendt ao escrever sobre Auschwitz em A Banalidade do mal, de que o mal não é radical, radical é o bem. Eis a nossa tarefa radical: o bem, na arte e na vida.

Curto o cenário

Então o filhote e eu começamos a falar os nomes das coisa vemos ou tocamos: areia, água, peixe. Explico para ele que tudo no mundo tem nome.


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