Depois de mais de um mês de
inverno e de neve, passeio de bicicleta com o filhote. Levo um caderno de
desenho e o celular para registrar algum traço do nosso passeio. A paisagem da
Praia, velha conhecida é nova, como novo é o vento. Então o filhote pede para
passarmos na floresta à Beira do canal. Na verdade um mangue meio abandonado
que descobrimos ano passado e, inventamos de caminhar nas suas trilhas enlameadas
dizendo que era uma floresta. De cima do barranco o intrincado das raízes
parecem esculturas de Frans Krajecber. Em um minuto passo em revista a obra
desse grande artista que viveu em uma caverna em Minas fugindo dos horrores da
guerra nazista. O que é viver sozinho no ermo do mato? Ele não teve medo? Neste
momento percebo umas caixas de papelão instaladas entre as raízes e panos
pendurados nas árvores.
Alguém está morando por ali,
penso. Entro ou não entro nesta floresta? O filhote insiste em descer, afinal
aquela floresta era nosso caminho de aventura há dois meses! Vou mais para
frente e descemos em uma área que julgava desabitada e segura. Começamos a
caminhada e a tensão se instala. Olhando para todos os lados damos alguns
passos. Então descubro uma bolsa jogada no chão, rasgada e com objetos
espalhados ao redor: moedas, batom, pincel de maquiagem, uma caneta e uma
carteira de identificação. Trata se De uma certeira de identidade da Slovenská
Republika. Na foto uma bonita moça, com data de nascimento, Julho de 1990. Uma
garota de 25 anos, como viera parar ali? Que teria acontecido? Será que ainda estaria precisando desse
documento? Que poderia eu fazer para lhe devolvê-lo?
Como desenhar neste cenário? Acho
que foi Adorno, filósofo da escola de Frankfurt, que disse que depois de
Auschwitz não seria mais possível a arte. Guardo o caderno. De repente aquele
cenário bruto e bucólico se revela ameaçador. Em Minha cabeça precipitam
imagens violentas. Tanta coisa pode estar por trás de uma bolsa rasgada jogada
na rua! Penso no mal que corrói o humano e na necessidade de todos os dias
construirmos o bem. Lembro me das palavras de Hannah Arendt ao escrever sobre
Auschwitz em A Banalidade do mal, de que o mal não é radical, radical é o bem.
Eis a nossa tarefa radical: o bem, na arte e na vida.
Curto o cenário
Então o filhote e eu começamos a
falar os nomes das coisa vemos ou tocamos: areia, água, peixe. Explico para ele
que tudo no mundo tem nome.
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