terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

CRIAR É A ARTE DE SE TRANCAR DENTRO DE UM QUARTO



 Aqui estou com mais um texto longo para Facebook, mas ao que tiverem paciência e interesse vamos dar um passeio. Olho a paisagem branca pela janela no atelier do prédio Wolf Kahn, um dos prédios de ateliês aqui. O branco convida ao silêncio. No Brasil é carnaval. Praticamente não ligamos televisão. Um outro silêncio, também branco, percorre o grande corredor que ao fundo, abre para uma pequena passagem que liga a outro prédio com mais ateliers, uns quinze talvez. As vezes nos visitamos, por alguns minutos, no mais cada um mergulha no trabalho. Neste sentido, a vida aqui é muito comum, é vidinha besta como diria Drummond, acordar, ir ao center hall para o café, depois para o atelier, voltar ao center hall para o almoço (comida sempre deliciosa ... salmão, camarão, carne vermelha, sempre cogumelos, saladas, sucos, café e desert: frutas, brawne, sorvete e outras coisas que não sei o nome), a tarde voltamos para o atelier e a noite também. Vida Comum mesmo, extraordinário é o que acontece entre as quatro paredes. Proust já dizia que ciar é a arte de se fechar dentro de quarto.

Ele, fez isso como ninguém! Eu pela primeira vez experimento um pouco disso. Aqui trancado nesse quarto viajo, por França Minas e Bahia, como diz uma canção e ainda inventei está de escrever estes textos, de pouca conta, para conversar comigo mesmo e com vocês teimosos, que dos seus quartos ou salas participam comigo desta residência no VSC. Lembro-me de um texto de Victor Hugo, que elogiava a teimosia, dizendo que diferente da coragem ou da força, que tem apenas um assomo, dizia que a teimosia tem a virtude de recomeçar sempre, de não se dar por satisfeita e, tanto no fracasso quanto na conquista, ir de novo ao ponto.

OLHO da janela do atelier e penso admirado na organização deste programa de residência que existe há quase trinta anos! Ontem conversei com John, artista septuagenário, um dos fundadores deste programa. Ele sempre vem almoçar no restaurante do center hall, com a roupa suja de tinta, alias a maioria chega lá com a roupa suja de tinta, como trabalhadores, que interrompem o trabalho apenas por alguns instantes para logo retornar. 

Chegam residentes novos, alguns já foram embora como Ola Aldous, artista russa e Cynthia Dewi Oka, poeta de origem indonésia e, fazem falta aqui. Vejo um ou outro carro passarem vez por outra um artista residente. O branco se estende até o sol nos trópicos, para encontrar a alegria dançante do carnaval, mas neste instante, não penso, como Melissa P. (100 escovadas antes de dormir) que lá fora tem alguém mais feliz do eu. Não, aqui dentro deste "quarto" acontece o extraordinário. 

 Este final de semana, comecei a trabalhar à óleo, era para ter feito isso logo que cheguei aqui, porque o óleo demanda tempo. Estranha mania de começar as coisas pelo fim! Estou apanhando, talvez por isso resolvo sair um pouco, para visitar outros atelieres. Depois do almoço visito os studios de Gretchen Scherer, jovem artista de New York, que faz um trabalho surpreendente de colagem e de pintura, Marna Shopoff, artista de Maiami, que trabalha pintura com um viés geométrico, cores puras e transparência de incrível beleza, Nicolas Ponton, Artista argentino cujo desenho marcado na pedra lembra o trabalho do brasileiro Marcelo Moscheta, o qual apresento a ele, Mercedes argentina, pintora de extração hiper-realista e pop que recria cenas do cotidiano como novo interesse visual e Hoda Kashiha, pintora iraniana, cuja figuração colorida desconcerta o olhar.

 Bem, fico por aqui, curtam as imagens, grande abraço. Boa noite, voa noite!
















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