Aqui estou eu com mais um texto
longo demais para Facebook, mas aos que tiverem paciência e interesse, vamos lá.
Estou digitando no iPad como se escreve à mão, errando, rabiscando, esquecendo
palavras, trocando letras, conjugações, acento nem se fala! O, torto, o errado,
o inacabado, desajeitado, feito à mão e com coração aqui tem lugar, como diz o
poeta Manoel de Barros "a maior riqueza do homem é a sua incompletude,
neste ponto sou abastado"
Sexta feira, dormi pouco, mas às
8:00 estou fazendo thai e chi, guiado por três amorosas senhoras aqui da cidade
de Jonhson. Fiz thai chi em cinco diferentes momentos da minha vida e eis que
esta pratica me encontrar aqui! O Vermont Studio center incentiva a pratica física
espiritual e oferece dois belos espaços aqui para meditação, yoga e thai chi.
Minha cabeça viaja longe quando ensaio os primeiros gestos, os mesmo do começo,
em Londrina, com Uma mestre inesquecível, depois em Vitoria, também com dois
mestres competentes, mas o tempo foi mais implacável, não sei mais nada dos
movimentos aprendidos, fico aqui tateando, guiado por essas três generosas
senhoras, que não se cansam de repetir os movimentos, para que eu as siga e
relaxe. No final perguntam se eu não tenho um gorro ou hat, porque me viram
chegar sem, acho que querem me dar um, agradeço, explico que vim sem gorro
porque era apenas atravessar a rua, elas não aceitam. Aqui eles saem completamente
vestidos aparamentados, luvas gorros, chaves, tudo certo, mas para mim o toque
frio e leve da neve ao atravessar a rua é como um beijo de nuvem.
Vou para o hall central comprar
minha passagem de Volta para Boston. Alguns residentes aqui me incentivam a
aplicar meu trabalho para uma bolsa que envolve pintura e escrita. Todos anos são
várias bolsas, sim porque a residência é paga! Acho interessante e peço um help
do meu fiel escudeiro Daniel Eliziario em Vitoria para me mandar imagens e pdfs
de alguns textos publicados. Ele manda, vem ao pedaços, preencho o formulário
do jeito que posso e anexo as imagens. Explica à atendente que não tenho todos
os documentos, ela diz que o mais importante são a imagens. Não é confortável
começar com a falta mais fico aliviado.
No almoço encontro com Jodi,
artista nova-iorquina que tem um desenho maravilhoso, com Ola, artista russa
americana inquieta e cheia de energia e com Hoda, boa pintora iraniana. Falamos
de como foi boa a caminhada ontem visitando os ateliês. Fico contente em saber
que meu trabalhos as tocou, Hoda me falou algo muito interessante, "parece
que seu trabalho se mescla com sua vida, você não se trata de ser pintor ou
desenhista, mas tudo que você faz, você faz arte, você pensa arte". Uau,
ela viu isso? Me acho tão sem graça tantas vezes! inadequado mesmo. Cada vez
mais tenho menos a dizer ou sei o que dizer. Antes parecia me que eu tinha
certeza, hoje sei que não tenho. As vezes escuto alguém dizer, "eu me
conheço muito bem, ou eu sei o que eu quero, eu confio em mim", coisas
nessa linha e tudo isso me parece ilusão, retorica.. Lembro que um dia, numa
conversa informal, em que algumas pessoas diziam que confiavam em si mesmo, eu
disse que não confiava em mim mesmo e que também não sabia o que eu queria.
Ficou todo mundo "assim", estranho e eu também. Se fosse para continuar
essa conversa eu diria, com Makhmalbaf, cineasta iraniano, que me acho
inadequado em quase todos os lugares. Outra hora falaremos mais disso. Mas Hoda
se referia principalmente aos desenhos-linhas meditação que faço todos os dias
e os o desenhos que chamo aquisição da língua, que é o exercício de aprender inglês
escrevendo, e desenhando em folhas de papel. Hoda acertou, posso não conseguir, mas é este
meu processo, isso inclui dar aula, viajar, esse texto aqui, etc. Acho que foi
Ad Reinhart que, disse "em qualquer lugar que eu vou, vou como
artista". Ola está indo embora amanhã, a residência dela é 15 dias, então
nos convidou para uma vodca no lounge e ela tocara piano. Convido -a par ir ao
meu studio para fotografá-la e criar um retrato dela como a serie reverso.
A tarde recebo o segundo artista nova-iorquino,
William Lamsam, convidado para o dialogar com os artistas. Ontem foi a visita
do primeiro artista, de nome parecido: William Villalongo, mas acabei não tendo
tempo de falar dele ontem. bem, o primeiro curtiu o trabalho, mas vibrou mesmo
foi com série de desenhos da Amazônia, não se cansava de folhear o livro
dizendo you are very gift in drawing, se eu entendi bem. Ele apontou também a questão
da tridimensionalidade nas fotografia, um toque que vou incorporar. Já o William
Lamsam gostou do desenho linhas meditativos (da série um desenho por dia 200
linhas que fiz durante três anos e três meses, alguém se lembra? pois continuo
fazendo, só que ligeiramente diferente), sobre as fotografia, disse que os
recortes poderiam, ao invés de ter figuras, ser somente o papel recortado,
assumindo assim o seu aspecto tridimensional. Porque não? Outra coisa que o
impressionou foi o projeto "um ano desenhado", para ele é uma coisa
nova, mais do que desenho, impressionou o "commitment”, ver artistas,
professores e alunos envolvidos numa tarefa continuada como essa. Foram dois
bons diálogos. Eles se foram e eu fiquei com aquela sensaçao boa de ter
comunicado algo e também com aquela velha impressão de que faço várias coisas
diferentes. Ē uma angustia que trago à anos, mas começo a ver com certa clareza
a ligação em todas essas coisas. As questões de fundo são sempre as mesmas,
como a casa, essa forma, que chamo de casa do passado que ē sempre as mesma, a
mesma casa há anos, uma imagem que remete à memória de tempos distantes, à infância
talvez, aos medos, desejos e fragilidades da infância e também o não ter casa.
Habitar esta casa, vê-la de dentro, percorrer quartos corredores, banheiros e
salas é o meu pensamento neste momento. Creio que entrando dentro desta casa
poderei colocar todas as minhas formas, todo o meu pensamento de arte. Ficamos
por aqui os que me seguiram linhas tortas, o meu abraço, agradecimento e boa
noite. Voa, voa noite!
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